21 janeiro 2010

O Poder dos Jogos Infantis

Por: Evelyn Vinocur - Neuropsiquiatra e psicoterapeuta no Rio de Janeiro

Existe coisa melhor do que sentar com o seu filho pra brincar? Do que reunir a família e jogar? A hora do jogo é um momento sublime, onde as energias se somam, onde a vivacidade fica aguçada, onde a gente aprende a ganhar e perder, a ver a alegria da criança ao estar ali saboreando a presença dos seus queridos... pra quem já passou por essa fase, se lembra do bem-estar de brincar de fazer castelo de areia na praia? De jogar dominó com o papai?

Jogar faz bem. Alimenta a alma. Ainda mais nos dias de hoje, com tanta correria, muitas famílias estão perdendo o tempo pra jogar em família. Cada vez mais, vemos jogos solitários, que também são bons, mas não suprem a intimidade e a união que os jogos em família fazem aflorar.

Tem sido mais e mais freqüente as queixas de crianças reclamando que os pais têm cada vez mais tempo pra elas, e uma das melhores formas de estar junto, é jogar. Vamos aproveitar e pegar um pouquinho do nosso tempo pra jogar com aqueles que a gente ama. Mas jogar é bom de qualquer jeito com amigos, com a nossa turma e com nossos colegas. Jogar sozinho também é bom. O jogo faz nascer potencialidades de dentro da gente, faz surgir idéias novas, inovadoras, faz a gente querer ganhar, descobrir, intuir, ter metas e objetivos e onde querer chegar. E tudo isso é muito bom para desenvolver aquilo que chamamos de funções executivas, que são nossas vontades voluntárias voltadas à realização de um objetivo. Já jogou em dupla? Que legal né? A gente aprende instintivamente a fazer boas parcerias, a saber como é ter um bom parceiro.

Quem joga, ativa as funções mentais, a performance global de vida, capacidade de se ter um rendimento global maior na vida. É bem verdade que como tudo na vida, tudo tem que ter a sua hora, o seu limite. O jogo também nos ensina a hora de parar. A lidar melhor com os nossos limites. A ficar bem, mesmo quando vemos o nosso parceiro ganhar. Você sabe que daqui a pouco vem a sua vez de ganhar também. O jogo atua no auto-conhecimento. Jogando, você vai notar que você, ou seu filho ou o parceiro do jogo recorrentemente apresenta falta de concentração ou coordenação motora, ou como está o seu estado emocional. Quem nunca jogou com aquele cri-cri que fica enfurecido ou desmantela o jogo quando ele está perdendo? O jogo é uma ferramenta de medição e aferição do nosso estado emocional. É a partezinha que aflora, que todo mundo vê, que nem a pontinha de um grande iceberg...

Você sabia que já na antiguidade, os Egípcios, Romanos e Maias utilizavam os jogos como meio de aprendizagem de valores, conhecimentos e normas sociais?

Mas então, porque tanta gente reclama dos jogos, que o filho fica horas jogando pra fugir das obrigações e etc? Até onde o jogar é um benefício ou um prejuízo à saúde dos nossos pequenos? Essa polêmica divide francos opositores e ferrenhos adeptos. Como tudo na vida, antes de qualquer coisa o equilíbrio. Não é dos jogos que a gente reclama, mas sim dos excessos. Excesso de tudo é muito prejudicial mesmo. De todo modo, universais e presentes em todas as culturas, os jogos constituíram desde sempre uma forma de atividade inerente ao ser humano, exercendo sobre ele um fascínio inexplicavelmente compreensível e muito sedutor. Ainda que algumas pessoas considerem o ato de jogar supérfluo, ele torna-se uma necessidade e um elemento vital para o equilíbrio social, cultural e psíquico do ser humano.

Segundo uma ótica sociológica, os jogos proporcionam elementos importantes à construção da personalidade e conseqüentemente à construção do conhecimento: a familiarização com o êxito, o que desenvolve a autoconfiança e segurança; a libertação de sentimentos de agressividade e frustração, de forma natural, criativa e até terapêutica. Ao jogar, a criança e o adolescente têm acesso a cultura da sua Sociedade, ao mesmo tempo em que a recria, sempre estabelecendo relações sociais com os outros. E mais, o jogo pode trazer à tona questões inconscientes e medos recalcados, facilitando o autoconhecimento das próprias emoções e do mundo interior de cada pessoa.

Desta forma, é patente que o jogar, de forma espontânea, é um elemento crucial para um processo educativo que tem como foco a autonomia do ser. Em geral, um pouco de jogo vai deixar a criança, o adolescente ou o adulto mais sociável além de melhorar o seu relacionamento interpessoal. É de praxe que suas habilidades visuo-espaciais, resolução de problemas e tarefas, rapidez de pensamento e raciocínio lógico fiquem bem mais afiadas . De igual modo, todas as habilidades atentivas e de concentração também ficam mais aguçadas.

Os jogos despertam a curiosidade da criança, são sedutores e promovem criatividade e produção de arte. Inúmeros são os atributos do jogo, todos estando de algum modo interligados entre si: representação do real versus o imaginário; manejo de dúvidas e conflitos; resolução de problemas e saber priorizar; habilidades sociais e funções executivas; determinação, perseveração e controle dos impulsos, manejo dos determinismos e aleatoriedade; segurança, confiança e auto-estima; correr risco; analise estratégica e intuição, e muito, muito mais...

Então aproveite!

Estudo em bebês promete desvendar os mistérios do autismo


Matai, no colo de sua mãe, Gemma, assiste aos estímulos visuais

Um bebê de quatro meses participou de um estudo inédito que vai ajudar psicólogos e cientistas a entender como algumas doenças cerebrais se desenvolvem, como o autismo. O pequeno Matai Reid foi monitorado por cientistas da Durham University, na Inglaterra, que avaliaram como seu cérebro respondia a diferentes imagens em movimento quando ele olhava para a tela de uma televisão. Para isso, ele teve de usar um engenhoso capacete com sensores que mediam e gravavam sua atividade cerebral.

Segundo Dr. Vincent Reid, psicólogo da Durham University, ainda não se sabe o suficiente sobre como o cérebro de bebês muito pequenos reage a certas coisas. Em entrevista ao tablóide britânico Daily Mail, ele afirma: “É vital nós entendermos este funcionamento para conseguir identificar problemas e atrasos no desenvolvimento, e assim conseguir diagnosticar mais precocemente doenças como o autismo”. Gemma Reid, a mãe do bebê, concordou em emprestar seu filho para o bem da ciência: “O simples ato de observar como os bebês se desenvolvem já ajuda a aprender como funcionam algumas doenças cerebrais”. Ela conta que Matai gostou de participar do procedimento, que, segundo o dr. Reid, “não é doloroso, invasivo e nem prejudicial para a criança”. Ele afirma que ele e sua equipe simplesmente estão analisando o cérebro do bebê a partir de uma perspectiva acadêmica.

A National Autistic Society (Sociedade Nacional do Autismo, na Inglaterra) descreve o autismo como uma deficiência no desenvolvimento que dura a vida toda. Pessoas que sofrem da doença tem dificuldades para se interagir e se comunicar socialmente. O próximo passo dos psicólogos é procurar mais crianças, acima de dois anos, para participar do experimento.

A RIADIS se solidariza com o povo Haitiano

COMUNICADO SOLIDÁRIO:

A Rede Latino-Americana de Organizações Não Governamentais de Pessoas com Deficiência e suas Famílias (RIADIS) expressa sua mais profunda solidariedade perante a grave tragédia que padece agora, o povo irmão do Haiti.

Na terça-feira passada, 12 de janeiro, o Haiti e, particularmente sua capital, Porto Príncipe, se viu assolado por um terremoto de grau 7,2 na escala Richter.Milhares de pessoas ficaram sepultadas, mortas ou feridas debaixo dos escombros de milhares de edificações, que não puderam resistir ao ataque da natureza.

O Haiti, país mais pobre do hemisfério, a partir dessa gravíssima catástrofe, se vê ainda mais pobre. Uma das mais graves seqüelas deste sismo é que deixa a intempérie, a fome e a desolação a uma grande parte dos nove milhões, que constituem a população desse país caribenho.

É muito possível que milhares de pessoas com deficiência tenham sido e sejam vitimas impotentes desta dolorosa tragédia. Assim mesmo, é certo que uma das conseqüências diretas desta catástrofe será o aumento do número de pessoas com deficiência no Haiti.

No passado, a RIADIS buscou contato com organizações haitianas de pessoas com deficiência para apoiar-las em seus esforços em melhorar as condições de vida das pessoas com deficiência deste país, mas infelizmente, esses esforços não tiveram sucesso.

Nessa difícil e trágica hora para a América Latina e Caribe, quando o primeiro país de nossa região que lutou e ganhou sua independência sofre essa tragédia, a RIADIS faz um forte chamado à Comunidade Internacional para que as manifestações de apoio do presente se mantenham e se ampliem, ao teor da magnitude da catástrofe no Haiti. É necessário ainda, que este apoio solidário perdure por todo o tempo que o povo haitiano necessite e que não se debilite com o passar dos dias e semanas.

Os povos do mundo e seus Governos não devem, não podem esquecer-se do povo haitiano.

É o nosso mais sincero desejo, como organização latino-americana, que se avance rapidamente na estabilização da situação nesse país do Caribe. Resgatando os sobreviventes dos escombros, atendendo aos milhares de feridos nos hospitais, sepultando as pessoas falecidas, atendendo eficientemente à propagação de epidemias e oferecendo alimentos e abrigo aos milhares de desabrigados.

São os primeiros passos essenciais, antes de começar a trabalhar com muito esforço (Comunidade Internacional, povo e Governo), na reconstrução do Haiti, para que avance na superação da pobreza, consolide sua democracia e se desenvolva pacificamente.

A RIADIS se compromete hoje, em realizar seus maiores esforços para apoiar o fortalecimento ou criação de organizações de pessoas com deficiência no Haiti, para que desde nossa visão e experiência, a atenção aos direitos das haitianas e dos haitianos com deficiência, esteja devidamente incluída na agenda da reconstrução e renascimento deste país latino-americano irmão.

Esperamos que muitas organizações, entidades cooperantes e pessoas, nos acompanhem para materializar em fatos este propósito e compromisso profundo da RIADIS.

Rede Latino-Americana de Organizações Não Governamentais de Pessoas com Deficiência e suas Famílias (RIADIS) http://www.riadis.net/riadis-em-acao-5/

O terremoto da pobreza


A tragédia do Haiti não é só produto da natureza; é resultado da incúria humana e da corrupção

João Coutinho - Folha de S. Paulo - 19/1/2010 - Ilustrada

LISBOA TREMEU em 1755. O Grande Terremoto horrorizou a Europa culta e pôs Voltaire a pensar. Onde estaria Deus? Sim, onde estaria Deus naquele Dia de Todos os Santos para permitir a matança indiscriminada de mulheres, velhos, crianças?

No século 18, Lisboa deixou de ser, entre os homens letrados do Iluminismo, uma mera cidade. Passou a ser, como Auschwitz no século 20, o símbolo do mal. Do mal radical, inominável, inexplicável.

Passaram 250 anos. Lisboa deixou de tremer. Ou quase: umas semanas atrás, nas primeiras horas da madrugada, senti a casa a dançar um "twist". Durou segundos. Alguns livros no chão, um copo partido. Por momentos, ainda pensei que talvez fossem os meus vizinhos em reconciliação amorosa.

Não eram os vizinhos. Os alarmes dos carros estacionados na rua desmentiam com estridência qualquer cenário romântico. Era terremoto, confirmaram as notícias. Nível 6 na escala Richter. Nenhum morto. Nenhum ferido. Nenhuma interrogação sobre Deus.

Exatamente o contrário do sucedido no Haiti. Incontáveis mortos. Incontáveis feridos. E, nos jornais da Europa, textos pseudofilosóficos sobre o papel do divino. O tom era comum. A tese também: a natureza é insondável.

Difícil discordar. Mas a tragédia do Haiti não é apenas produto de uma natureza insondável. É o resultado da incúria humana; da corrupção; da miséria material; e da tirania.
Eis a tese apresentada em ensaio fundamental para entender a contabilidade macabra dos desastres naturais. Foi publicado em 2005 por Matthew Kahn em revista do prestigiado MIT. Intitula-se "The Death Roll from Natural Disasters: the Role of Income, Geography, and Institutions" (a lista da morte por desastres naturais: o papel da renda, da geografia e das instituições).

O objetivo de Kahn não é metafísico; é bem prático. E foi motivado por crença comum, que vi repetida nos últimos dias: por que motivo os desastres naturais só atingem nações pobres?

Kahn começa por provar que uma crença não passa disso mesmo. Entre 1980 e 2002 (o arco temporal do estudo), a Índia teve 14 grandes terremotos. Morreram 32.117 pessoas. No mesmo período, os Estados Unidos tiveram 18 grandes terremotos. Morreram 143 pessoas. Iguais conclusões são extensíveis aos 4.300 desastres naturais do período em análise e às suas 815.077 vítimas. Observando e comparando 73 países (pobres, médios e ricos), a conclusão de Kahn é arrepiante: os grandes desastres naturais distribuem-se equitativamente pelo globo.

O que não se distribui equitativamente pelo globo é o número de mortos: países com um PIB per capita de US$ 2.000 apresentam uma média de 944 mortos por ano. Países com um PIB per capita de US$ 14 mil, uma média de 180 mortes. Moral da história? Se uma nação de 100 milhões de pessoas consegue subir o seu PIB de US$ 2.000 para US$ 14 mil, isso resulta numa diminuição de 764 vítimas por ano.

Mas a análise não se fica pela riqueza. Não se fica apenas pelos países que têm maior capacidade para planificar com rigor, construir com segurança e socorrer com rapidez. A juntar à riqueza, a política tem uma palavra a dizer.
A política, vírgula: a democracia e a boa governação. A disparidade dos mortos não é só imensa entre países ricos e pobres; também o é entre países democráticos e não democráticos. Em países democráticos, onde os governantes são julgados pelos seus constituintes e vigiados por uma imprensa livre, a forma como se planifica, constrói ou socorre é o verdadeiro teste de sobrevivência para esses governantes. O número de mortos em países democráticos é, mostra Kahn, incomparavelmente inferior aos mortos anônimos dos regimes ditatoriais/autoritários.

No Haiti, um terremoto com 7,1 graus na escala Richter trouxe devastação inimaginável e dezenas de milhares de mortos. Em 1989, um terremoto com 7,1 graus na escala Richter provocou 67 vítimas nos EUA. Nenhum espanto: os EUA não têm um PIB per capita de US$ 1.400 e não foram governados por "Papa Docs", "Baby Docs" e outros torcionários para quem o destino do seu povo era indiferente desde que a rapina pudesse continuar.

Em 1755, quando o terremoto de Lisboa fez tremer a Europa, ficaram célebres as palavras do marquês de Pombal: é hora de enterrar os mortos e cuidar dos vivos. No século 18, era impossível dizer melhor. No século 21, impossível é dizer pior. Depois de enterrar os mortos e cuidar dos vivos, só existe uma forma de mitigar a violência da natureza: enriquecendo e democratizando.